ABRIMOS NOS DOMINGOS 15 e 22 DEZ.

Aberto de 2ª a Sábado
das 10h às 14h e das 15h30 às 19h30
abrimos à noite para as sessões agendadas

AGENDA

07/06/09

ler e depois (2)

O Nuno, a Maria do Carmo e o Joaquim

Conheci-o através de “O Tempo e o Modo”, onde desde o primeiro número o Nuno colaborou. Uma prosa certeira, uma crítica implacável, alguma ironia e outro tanto de humor. Tudo isto numa secção da revista que se chamava, e bem, “noticiário crítico”.
Depois, já não recordo como nem quando, tive o prazer de o conhecer. Conhecimento fugaz, devo dizer, que eu vivia em Coimbra e o Nuno em Lisboa. Mas lia-o, pois ele desmultiplicava-se em textos. Ainda recordo algumas críticas de cinema, num tempo em que isso era a sério. Aliás, tenho a vaga ideia de que ele terá colaborado nos “Verdes Anos” do Paulo Rocha, um dos filmes mais marcantes do que ilusoriamente se chamou o “novo cinema português”.
Todavia, foi para mim e para muitos mais, decerto, “A noite e o riso”, um livro incendiário, uma escrita inventiva, um delírio controlado, humor, ar freco na literatura nacional.
Eu deveria, agora, dedicar-me a uma exaustiva crítica mas, francamente, não é este o momento e muito menos o lugar. Os leitores que me aturam não precisam de baby-sitter literária e se forem como eu suponho, querem mas é saber as novidades e depois decidirão. Aliás, haverá prazer maior do que entrar na livraria, na nossa livraria, agarrar no livro, folheá-lo, rir sozinho, comover-se, mostrar à amiga ou ao amigo e depois, num gesto largo e moscovita, avançar sobre a caixa e soltar pesarosamente os maravedis necessários à compra do tijolão “Obra Completa”?

E é aquí que torço, metaforicamente, o nariz. Não que não seja evidente o interesse em publicar o Nuno. Todo, se entenderem. Porém, convenhamos, um tijolo é um tijolo e juntar os cinco importantes textos num único volume, tira-nos um par de gozos, desde meter o book na algibeira, para o ler em qualquer sítio, até esta pequena coisa que é ir comprando devagar, à medida dos humores e dos cacauzinhos, os livros, um de cada vez, em ordem dispersa. Ou de receber qualquer um deles como prenda de anos, da namorada, dos filhos da esposa amantíssima ou até de algum membro da “Causa Real” (poderia ser o Dr. Teixeira Pinto) por engano quanto ao autor.
Que este Nuno, meninas e meninos, é Bragança dos verdadeiros, dos que reinaram vai para mais de um século. Só que ele se estava nas tintas para o facto. Escrevia, e que bem!, lindamente. Eu não resisto a aconselhar além da “Noite…” o belíssimo “Directa”. É que o “Directa” diz muito a este escriba que, em seu tempo, também exerceu de passador de fugitivos políticos. Nisso, e só nisso, eu fui colega do Nuno. Aquele livro ressuma realidade, para além de ser uma bela história e de estar muito bem escrito. Mas, a menos que andem desesperadas pelos alfarrabistas, só vos resta a compra de “Obra completa” de Nuno de Bragança.

E, agora, uma novidade, uma meritória novidade. Que o não é. A “Almedina” (invenção genial do meu querido e velho amigo Joaquim Machado) publicou há tempos “Angola, processos políticos da luta pela independência”. A autora, Maria do Carmo Medina, é advogada e defendeu com invulgar coragem e rigor e incalculável risco, vários presos. Deste pequeno canto, saúda-a um colega que também fez uma perninha nessa honrosíssima actividade.
Leitoras e leitores. Leiam este livro, pelas almas. Convém saber como as coisas eram lá, e como a pide lá era tão facínora como cá. Como nota curiosa, este livro traz em anexo documentos importantes para a nossa história.

E por aquí me fico. Não, ainda não. Falei do Joaquim Machado, um livreiro de mão cheia e um editor de “sebentas” coimbrão. Fui amigo dele e recordo-o com alegria. Era, além do mais, um vendedor de livros. Da sua livraria em frente à “Brasileira” ele carrgava embrulhos de livros para o nosso café. Vinham endereçados ao Américo Caseiro, ao Cunha Pinto (o Leonel Brim de “Talvez Pinóquio” e “Magistério e Desgosto” dois textos de primeira água, de primeiríssima água) e a este vosso criado. Eu bem lhe dizia “Ó Joaquim Machado eu não tenho dinheiro para pagar tudo isto, homem de Deus!”. E ele, num sorrizinho sacana e amigo: “Há-de ter, há-de ter, eu espero.” Paguei tudo até ao último tostão. Só não paguei a confiança, a amizade e o excelente critério do Joaquim. Só para exemplificar: foi ele que me vendeu os três calhamaços das “Mytologiques” de Lévy-Strauss. Arriscou forte dinheirama, olá se arriscou. Foi assim que o Joaquim criou uma grande rede de livrarias. Bom trabalho, Joaquim, excelente trabalho.

* a gravura é uma fotografia do Joaquim Machado. Sem livreiros não há editores nem autores que se safem. as livrarias são faróis, são casas de amigos, são como o "Espaço...", pontos de encontro, de alegria de convívio.

Sem comentários: